sexta-feira, 19 de março de 2010

ATÉ LÁ


Até lá ainda vai acontecer no meu rosto
Uma chuva qualquer num outono
O músculo engrenado num pranto ou num riso
A cor da saudade daquela menina
A calmaria dos sonos desordenados com o relógio do dia

Até lá ainda vai me acompanhar por aí
Uma lua que sopra o que os loucos ouvem
A doçura que falta no que os covardes escolhem
O ponto final de toda mentira
O descaso afinal que flutua acima dessa vida impostora

Até lá
Eu serei menos o que nem sou
O que nunca fui
O que nunca estou
Quando na curva de um conselho eu me abasteço de outro valor
Até lá um dia dirão tudo que eu ousei dizer
Dirão que eu morri de tanto o meu coração bater

segunda-feira, 15 de março de 2010

TUDO É BOM


Não
Você não vai rolar pelas escadas do teu coração
Você não vai sempre passear de mãos dadas à essa solidão
Beber sempre esse copo de Não... não

E se o melhor foi a hora perdida?
O vagão lotado
Um desencontro na saída
O trânsito parado
O telefone mudo
O abraço absurdo que a campainha não berrou

E se o melhor foi a data esquecida?
O caminho trocado
Uma outra avenida
O celular roubado
O endereço trocado
O email apagado que alguém um dia enviou

Um dia
Que dia?
Quem diria haver tanta vontade em quatro letras unidas?

Não
Você não vai rolar pelas escadas do teu coração
Alguma hora da vida tudo é bom

quarta-feira, 10 de março de 2010

O ALCOUCE DAS BRUXAS


Cantam afinadas deitadas sobre o meu peito
As bruxas que me adotam
Que me aceitam sem fantasia
Belas e gostosas
Visitam minha vida
Minha alma e minha história
Quando a cachaça doce e fluorescente
Beija a minha boca afiada mas calma

Vão elas tão lindas
Tão soltas e sábias
Sem roupa
Sem profissão
Sem cartão de crédito
Sem o carimbo medonho do falso sucesso

Me dão seus peitos fartos
Suas coxas vivas
Suas bundas certas
Seus braços aflitos
E eu aqui
Vivo e descanso
Na secreta e suculenta paz desses lábios

terça-feira, 9 de março de 2010

TEM MAIS


Vou para o meu lugar
Afastado agora de você
Vencido pela tua revoada de não
Vou sair daqui
Do teu chão comportado
Subsolo da minha alegria
Aquela que te dei aquele dia
De mãos dadas
Enquanto nossas passadas venciam a multidão
Venciam as distâncias das nossas possibilidades

Vou para o meu lugar
Alto como meu coração gosta de respirar
Ar rarefeito de vozes matemáticas
De contas e anúncios da televisão
Onde eu sonho o que vivo
Pois a minha vida é a minha maior invenção

Tem mais de nós por aí
Tem mais de mim em você do que só o espaço que eu ocupava naquele colchão

segunda-feira, 1 de março de 2010

PERCEPÇÃO


Hoje desapareci dos espelhos
Dos olhos e das vitrines
O vento não me achou
A chuva não me molhou
O sol... onde mesmo eu fui deixar

Quem é esse que vive do outro lado do meu olhar?
O lado de dentro
Quem é esse que não consigo medir com as réguas de que se valem toda a canalha?

Esse que quando vai eu sigo
Esse que quando dói eu choro
Que quando cai eu me machuco

Que quando ama eu flutuo sobre esse mesmo mundo anunciando que meu coração já tirou o sol do castigo
E hoje ele já vai brincar fora de casa

E SE


E se fosse loucura?
Isso aqui
Bem aqui comigo
Levitando meu corpo ao redor do mundo
Tornando o meu peito um lugar distante
Brilhante e fundo

E se fosse loucura deixar assim ir embora?
Sem espernear
Sem berrar
Tão triste e tão calmo

E se fosse loucura eu teria o seu perdão
Mas é amor
E amor você não perdoa