domingo, 28 de agosto de 2011

BALADA DE UM SONO TORTO


Entende de uma vez
Isso não depende de você
Meu primeiro olá já tinha gosto de adeus
Os sonhos meus eu nunca te dei
Entende

O caminho que sou eu
O espinho que sou eu
Você não tem como querer
Você não tem como cuidar
Você não pode me curar
Das folhas de papel onde meu coração foi se esparramar
Antes de agora
Antes de amanhã

Não chora
Eu fico
É só a minha alma que já vai embora
Entende

Entende de uma vez
Não tenho como levar você
Teu passo não pisa a minha estrada
Meus fantasmas não habitam a tua casa
Entende

O barulho que sou eu
A saudade que sou eu
Você não tem que sentir
Você não tem que se danar
Você não pode me curar
Das noites escorridas com gosto de sal
Depois do começo
Depois do final

Não chora
Eu fico até você dormir
Até você acordar de dentro do meu coração sem juízo
Entende

terça-feira, 23 de agosto de 2011

A ROSA QUE NÃO DEU SAMBA

Lá vou eu explicar o que te fere então
Olha bem, não tenho mais coração
Foi comido
Devorado por aí
Você bem sabe que hoje eu vivo sempre ali
Onde o teu perdão não consegue me seguir

Lá vou eu confessar o que não sabes não
Olha bem, eu gastei todo o meu coração
Joguei na sorte
Não fiz economia
Você nem sabe como quis dá-lo a você um dia
Mas só ressentimento era o troco que eu recebia

Claro que sim
Eu gostaria de te perder de mim
Beber da cachaça a alegria e não a escures da noite
Girar na rua e não dobrar ao açoite
Desta sombra que só diz: não estou... não estou.

Agora sim
Já estão acessos os dedos da lua
Eu já me ergo onde a minha alma não é mais tua
Eu sou o tempo que te abandona.
Tão nova e já toda murcha
Tão nova e já toda murcha

QUEM?


Você termina o dia olhando através de uma janela
Teu corpo feito um trem antigo que só queima carvão
Você distribui adeus e um sorriso engessado pela sala
Aperta os olhos quando finalmente o elevador alcança o saguão

Você caminha ereto sendo sempre tão seguro
Mostra a sua pressa pra ficar em dia com a multidão
Ignora as besteiras de amor pichadas num muro
Tem numa planilha todos os números do teu calculado coração

Você lê seu jornal com a mesma exatidão nos olhos
Atenta às oportunidades que lhe trarão o teu milhão
Sabe tudo e sabe que é melhor que esses sujos fedelhos
Investe nuns papeis do mercado toda tua educada escravidão

Ah, mas disso que à noite te caça você não sabe não
Disso que à noite te caça você não tem noção

Você não começa sua manhã apertado numa Van
Respira a fumaça numa tabacaria com gente bacana
Debate política social bebendo um Cheval Blanc
Existe postado sempre acima de qualquer atitude sacana

Você segura a taça conforme as normas da etiqueta
Cospe desaforos com teu articulado vocabulário
Sente nojo da humanidade esparramada na sarjeta
Comemora fevereiro como alguém que atravessa um cemitério

Ah, mas disso que à noite te caça você não sabe não
Disso que à noite te caça você não tem noção

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

MENINA DE FEVEREIRO


Se perde boba e aguda dentro da clareza do meu coração
A mesma fala intacta de qualquer verdade
A mesma miséria no olhar cheio de contradição

Se perde solta e livre dentro da bagunça do meu coração
A mesma que corria o leito do sonho daqui
A mesma que havia antes de haver o chão

O que me dói então?
Se sabes tudo diz o que me dói então?
Se és a dona do mundo por que vive presa no fundo da tua própria solidão?

Passeio pelas tuas veias o dia inteiro
Passeio pelas tuas amarguras
Passeio pelas minhas alturas
Por que gosta tanto de me machucar, menina de fevereiro?
Minha doida de fevereiro

Se acha quieta e chorosa quando no sono te abraço enfim
A mesma mistura de violência e ternura
A mesma fundura onde tua alma se joga sobre mim

Se acha engraçada e úmida quando me acha no teu tesão
Teu medo é meu corpo do outro lado da rua
Teu receio é que eu possa ver na tua escuridão

O que me rói então?
Se sabes tudo diz o que rói o meu coração?
Se és a mulher que me procura então me tira do lodo da tua falta de perdão

Passeio pela tua nuca o dia inteiro
Passeio por debaixo da tua vergonha
Passeio pelas vontades da tua manha
Por que gosta tanto de me evitar, menina de fevereiro?
Minha doida de fevereiro

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

SEMPRE VOCÊ


Deixa eu ir então
Olha a lua e o céu
Olha meu coração
Só no meu canto eu posso ser teu

Deixa eu sumir
Tenho que chorar
Tenho que medir
A distância do meu próprio olhar

Olha a noite viva
Olha o corpo solto
Olha o copo leve
Olha a minha mão

Olha a minha mão
Deixa minha mão

A veia toda turva
A hora toda quieta
A música absurda
A flor toda aberta

Dos erros a tua demora
Dos pecados essa distância
Do resto eu vou embora
Do resto estou lá fora

Deixa eu fugir de ti
Deixa eu fugir de mim
Não é fácil assim que eu vou te esquecer
Você é sempre você

terça-feira, 9 de agosto de 2011

ANTIGO CORAÇÃO


Ontem eu te vi e não era você
Quis sorrir mas não soube entender
Que no fim da tua vaidade tão mesquinha
Você era ainda mais minha
Quanto mais minha tentava não ser

Ontem eu te vi e não era você
Toda cheia de si sem poder esconder
Que tanta alegria era feito um carnaval
Que queima até de manhã
Pra apagar quando chega o sol

Finge mais pouco
Me pega no ato
Vê se me deixa louco
Cospe no meu prato

Eu choro essa dor um pouco mais
Eu sigo a tua versão
Só não devolvo depois
O teu antigo coração

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

PACIÊNCIA 2011

Onde se esconde então?
Longe da fumaça dos carros pela manhã
Longe das besteiras ditas à mesa do café
Pois é
Dizia ser vã a minha vontade de perder o chão
A minha doença de fazer luz da tua escura solidão

Sabes tudo dessas coisinhas com tempo finito
Sabes tudo de coisa alguma
Onde mal se arruma dentro da roupa de fingir-se inteiro
Vejo bem o boeiro da tua alma
O canteiro das tuas rosas murchas
Os teus pedaços que escorrem do teu juízo

Não podes me alcançar
Não podes tocar-me no ponto onde eu existo

Paciência!
Um dia desses ainda te faço um carinho