sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

O RISO

Tomba o sol num arco que envelhece o dia
Tomba o riso
Desce até o porão da alma
Tomba o sono de quem abriu os olhos e ainda era noite
Ainda era pouco o tempo do sonho

A escova lambe os dentes
O ôculos embaça com o vapor do café
O jornal mente seus interesses
Tomba o riso
Sempre ele
Desce até o porão da alma

Levanta a lua num arco que envelhece a noite
Levanta o riso
Sobe até o telhado da alma
Levanta o coro de quem fechou os olhos e ainda havia vida
Ainda havia o amor além do concreto

A música voa sobre as cabeças
O copo suado da cerveja gelada
O poeta travestido de si mesmo
Levanta o riso
Sempre ele
Sobe até o telhado da alma

LOGO ALI

Então logo ali
Quando o bairro dormia
Entre o sol e a folha de papel onde amarelava a poesia
Nínguem pra sorrir
O que eu então faria?
Enquanto o alfinete mordia os dedos que juravam ter sangue azul
Tudo transparente...
Nenhuma realeza
A cama
O travesseiro
O sono feito o gosto da cachaça fria

Então logo ali
Quando a cidade fingia
e ninguém sabia que o perdão daquele bêbado era escrever
Eu vi você em branco e preto
O que eu então queria?
Quando na esquina do meu pensamento a curva eram os teus olhos
Tudo distante e frio
Nenhuma paz
A cama
O travesseiro
O som do cheiro que o teu santo nunca foi te contar

Então logo ali
Tanto calor e nem choveu
Diz com que olhos eu vou te esquecer
Diz com que olhos eu vou te receber antes do final

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

É TARDE

Não poste rosas sobre o meu peito
Não seja atenciosa
Não dê-me o teu lenço
Quero lembrar-me do vermelho nos meus olhos
Da gramática errada
Da vontade bagunçada que me esvaziou por dentro

Não me receba com um sorriso aberto
Não estique a conversa
Não espere por um depois
Vou abrigar-me na saudade dos meus amigos
No meu nome lembrado
Na história contada quando eu não estiver mais por perto

Pra que isso agora?
Esse vento foi a tua própria voz que soprou
A ressaca que castigou o meu coração
Lá atrás eu já te dei o meu perdão... e foi com amor

Pra que isso agora?
Minha alma já escapa
É tarde

SEM CULPA DEPOIS DE TANTAS

Assim me escorre o que eu penso
Meus olhos vermelhos dessa febre
Meu torso rebatendo o vento
Feito a primeira madrugada às claras
Feito o gosto de vodka aos doze
Doce e sem culpa

Assim me escorre o que eu sinto
Minha voz numa estrada só de ida
Minha dor e alegria noutro tempo
Foi a reza de meu avô em silêncio
Foi a festa na qual me postei calado
Indócil e sem culpa

Quando enfim eu me reservo um pouco
Longe da mesmice madrasta
Disponho as rosas sob o teu ventre
Lua, oh Lua
Mãe da minha precisa loucura
Esse desajuste onde me acerto
Onde eu desperto do corriqueiro pesadelo pra ser o estranho
Pra ser só o Beto

Assim me perdoa o que eu penso
Meu adeus sempre todo sem jeito
Meu coração mergulhado aqui
Feito um submarino submergido no mundo
Feito isso que eu aceito
Meu desconforto sem culpa
Sem culpa depois de tantas