terça-feira, 4 de dezembro de 2012

NEM TUDO É TÃO POUCO ASSIM


Ei
Enfim eu voltei
O perdão na doçura dos meus olhos ácidos
O meu sangue torrencial feito tua praia
Minha presença absurda
Vagabunda e sem lugar
A solidão que às quatro perambula pelo jardim
Pois a gente sabe
Sim, a gente sabe
Nem tudo é tão pouco assim


Eu cheguei
E na mesa a conversa já morreu sorrindo
Na cama o amor já se cobriu naquele livro
Que ninguém jamais leu
Ninguém jamais o viu

Na sala inoxidável eles temem o que você traduz
Rogam suas preces à tua partida
Cantam à tua desolação
Pois ficar à porta olhando a rua enquanto a alma se atrasa
É pra eles uma puta falta de educação

Vamos lá
O que é a fúria dos que dispensam fácil acomodação?
Quando o monstro rosnar não se esconda
Responda:
Hoje não! Hoje não!

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

VOCÊ


Você
Que se posta agora a frente do meu ser
Que calcula
Que sabe o valor dos percentos
Você que ri aquilo que deveras chora
Que olha pra mim
Renega a minha criança e diz:
Vá embora!
Agora não é hora!

Você
Que hoje priva meus pés da textura da rua
Que me veste
Que me dá teu veneno maduro
Você que é o espelho que me machuca
Que me afoga
Rasga os meus desenhos e diz:
Vá embora!
Agora não é a hora

Você
Que esqueceu daquele tempo
Que esqueceu do que eu queria
Esqueceu o que eu sentia
Se era noite ou era dia
Se era dor ou fevereiro

Pra onde foi o meu mundo inteiro?
Você é triste
Eu sou aquele ainda
Eu não sou teu prisioneiro

Você dormiu todo esse tempo em silêncio
Esperando
Espreitando
Caçando o meu sorriso
Bebendo do meu choro
Fez o que com o que era livre?

Veste teu terno e olha pra mim
Olha a lua e olha o sol
Vai embora de mim
Vai embora de mim

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

O Diário de um Espantalho


Eu vou assim
Por aí
Eu sei o que dói em você quando os teus olhos me revelam
O gosto que a tua boca desconhece
O ponto cego que o teu coração não vê
Sei lá, não há luz alguma nas tuas velas

Claro
Sim, sou eu
O farrapo que atravessa a tua festa
Mas não vejo ninguém aí sorrindo
Não vejo uma só cor na tua futura fotografia
Pra onde?
Pra onde você corre quando a tua verdade te assombra?

O carro
A bebida fina
A luz estroboscópica
Seu caráter agachado no escuro
Cuidado, aí vem São Francisco com os olhos de raio x
Aí vem São Francisco com seu violão
Tá bom
Eu prometo não falar mais sobre isso

Eu vou assim
Por aí
Você diz que acha divertido a bagunça que há em mim
Por que então eu nunca te vejo sorrindo?
Por que você fita o espelho e continua mentindo?

segunda-feira, 16 de julho de 2012

QUARTO ESCURO


E se a insônia é a escola de uma alma andarilha?
E se a gargalhada é a pedrada na etiqueta de vidro?
E se mesmo depois de assassinado o sonho respira?
Se o gosto solitário não tem o sabor que a canalha acredita?

E se a lua é um retrato nos olhos dos bêbados?
E se o riso é a saudade que negam os que se dizem perfeitos?
E se a indiferença é a maquiagem dos abraços viúvos?
Se a solidão é estrada dos poetas?

E se a pressa for a desculpa dos tristes?
E se a falsidade for a puta dos ocos?
E se a comodidade for a mãe dos covardes?
Se o choro for a força dos santos?

E se eu fosse menos maluco
Se eu fosse menos distante
Teria o gosto nu das mulheres de estanho
Teria a vida pequena
Uma foto numa estante

E se a música é uma prece desavergonhada?
E se a alegria é o dom dos desajustados?
E se a compaixão é o segredo dos sábios?
Se o céu é o quintal de todas as crianças?

E se eu fosse como tantos outros?
Você ainda me detestaria com tanto carinho?
Se a minha calçada é essa tão distante da sua
Por que teus olhos ainda fazem berrar os meus sinos?

E se este meu amor que carrego
Surrado pelo mundo
Pisado no fundo
For o analgésico do meu coração sem parafusos?

Mesmo assim eu não prestaria?
A luz é um absurdo no universo de um quarto escuro

domingo, 29 de abril de 2012

É FODA


Quando chega assim
A cama pronta pra ser desarrumada
A noite pronta pra acordar em mim
É foda a vontade
O quadril que me chama
O quadril que reclama minha mão

Quando chega assim
O amor uivando pelos meus olhos
O tempo andando sem rumo em mim
É foda a saudade
Meu coração indomável
Meu coração inflamável por aí

Quando chega assim
A mentira com sua roupa rasgada
A desculpa com sua voz engasgada
É foda a virada
O copo que vai até a boca
O copo que cai a mesa sem uma gota de cachaça

É foda a cidade
Quando a alma voa em todas as suas calçadas


segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

NÁUFRAGO

A tarde descompromissada
A sola do tênis tocando a calçada
A rotina turva do bairro
Na vitrine dos meus olhos um mar
O pensamento
Um mar
A tormenta
Eu e o canto da Sereia
Um náufrago do mundo
A solidão
A nefasta vaidade de tudo
Eu subindo no fundo de mim
Onde repousa sem fim o baú de minha alma

Da janela de sua vida ela procura
Seu mar
As minhas alturas
A fundura da saudade
A novidade alegre que demora
A ressaca agora
A ressaca no copo americano
Seu canto eu respondo
Eu subo
Sim, eu subo já bem pro fundo de mim

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

BANQUETE

Se quer saber eu confesso sim
Não sou imune ao teu descaso
A tua raiva que te cega de mim
A bruma odiosa que dita pra ti as minhas podres dívidas

Segue você sempre firme nisso aí
Sempre determinada em ter a certeza de que caí
Quando numa esquina me deparei com teu nome

Se quer saber eu morro sim
Na cama que amanhece muda
A curva analgésica que a vida não toma
A borda doida de onde o coração se joga
E nunca encontra o fundo
Nunca se perde de tudo
Nem de mim e nem de você
Nem do nosso bobo mundo

Se quer saber eu confesso sim
Nesse banquete que é o mundo
Eu sou livre o bastante pra ter fome só de você

domingo, 12 de fevereiro de 2012

22-03-2009

Quem diria
Naquilo que seria a minha alegria
Naquela noite
A música que eu esperava pra cantar sorrindo
Rolava pra todos
Cuidava de todos
Eu ficava quieto
Sufocado
Vendo o nó da minha vida bem ali
Dançando como se o meu mundo tivesse acabado

Quem diria
No tombo que enfim me salvaria
No foço de tudo
Eu mergulhado onde minha alma me escapava
Pulava os muros
Quebrava os ritos
Aliviada
Tendo o nó como uma ave quebrada
Que se retorcia de solidão pensando que dançava

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

COISA ALGUMA

Alguma coisa
Que não cala
Que não cansa
Que no tempo não se gasta
Que teima
Que reina além da tirania cotidiana
Que brilha como se dentro de mim queimasse alguma coisa

Alguma coisa
Que me conhece
Que me decora
Que voa acima das minhas palavras
Que manda
Que narra as preces da minha insônia
Que assombra o copo americano da minha cerveja de quinta-feira
Como se o copo soubesse do meu coração alguma coisa
E todo o resto tão normal lá de fora de mim fosse coisa alguma

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

UMA CARONA

Como é rezar?
Eu sempre andei quieto
Eu sempre me achei solto quando trovejava
E aquela gente toda da chuva se escondia

Qualquer santo me olhava e já sabia
Que eu nem lá estava?
Eu nem lá vivia

Quão enorme foi então a tua teimosia em me buscar
Em me querer
Em me jurar o que hoje não se jura por aí todo dia

Como é rezar?
Eu sempre fiquei na minha
Eu sempre guardava no meio dia a luz da lua
A luz da lua
A vontade nua em mim
Sem a mentira que conta essa puta chamada Apatia

E hoje quem vem me buscar?
Quem vai me levar?
Pra lá
Pra lá
Pra onde onde a solidão já me conhecia

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

CASARÃO

Ei, casarão
Como é que vai você?
Não faça cara de espanto, não
Aqui dentro eu ainda posso te ver

Ei, casarão
Onde é que a gente foi se perder?
Fantasiado de silêncio e solidão
Do nosso barulho eles não tem como saber

Ah, eu ignorei você
Ou não
Foi quando eu tinha fome da fome que iria ter
Foi quando eu pensei do amor saber
Antes de pegar fogo na minha cama
Antes de Juliana
E só Juliana

Ei, casarão
Como é que vai você?
Teus fantasmas leem minha mão
Tua sombra não me assombra
Minha sombra
Minha dona, cadê?

Ei, casarão
O que um coração sacana ainda pode aprender?

Ah, eu esqueci você
Ou não
Foi antes da esquina do teu fim
Foi antes da virada que guardei em mim
Antes de ter tanta distância na minha cama
Antes de uma estrada longa e turva
Chamada Juliana

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

MAIS TARDE

E já vem o fim da noite
E no começo de mim
Arde um fogo sem senhor
Que não ousam os de boa educação
Os de postura intacta
Os que não ficam de pileque
Os que não choram esparramados pelo chão
Os que não gargalham desengonçados

Queima as minhas desculpas
As minhas mentiras
As ranhuras do meu coração
As armadilhas da minha covarde razão

Me pergunta sem vergonha
Como quem, da minha alma, um segredo roubou
Quantas Marias a vida já te trouxe e te arrancou?
Quantas noites tirastes de ti pra viver o amor que você sempre sonhou?

E já vem o dia breve
Meu coração por aí
O mundo eu abandono num sono químico
Na pílula
Na prece que não termino

Mais tarde eu amo de novo
Acordo e uivo
Mais tarde eu sou leve
Eu sou do mundo de novo