sexta-feira, 23 de outubro de 2009

NAQUELE DIA AQUELA NOITE


Naquele dia quando passou
Rasgou a couraça de aço que trancava a voz
Sem usar de força
De músculo qualquer
Oras menina com seus segredos
Noutras poucas mulher com seus anseios
A endorfina louca flutuando nas veias
E o corpo divorciado de seu peso

Beliscaram-se os sérios
Quando viram que do fundo da noite andarilha
Brotavam vagabundas idéias
Tão lindas que a lua ascendia com seu riso de ponta-cabeça

Derramava seu brilho sobre a gente
Aquela noite os tristes de tão adultos se esconderam em suas igrejas
Enquanto as crianças riam
Esticando os braços
E a lua pescava uma a uma
E em pouco tempo deram cria as estrelas do céu

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

FABRIZIA


Foi assim sem querer
Que aquele tempo passou
Que a nossa voz ecoou naquele quarteirão
O bairro todo uma nação
De meninos e meninas esparramados pelo chão

Foi assim sem apitar
Que aquele recreio acabou
Que tivemos receio de rabiscar um desenho
No espelho um estranho
Que mantinha no rosto o mesmo olhar castanho

Sabia que eu gostei de você?
Um amor sem carne
Só a alma feito uma escada
A vontade de brincar juntos a vida toda

Foi assim sem palavra
Que a tarde ficou veloz
Que a noite ganhou luz sem ter estrelas
Na tv cresceram as telas
E a imaginação deu lugar às certezas tolas

Foi assim sem perceber
Que depois a gente cresceu
Que a gente se esqueceu pela vida afora
O mundo inchou lá fora
E o bairro se esconde num fundo do peito agora

Mas eu lembrei que gostei de você
Um amor sem dor
Sem corpos a se pegar
E a gente pescando pipas pelo ar

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

COMO?


Como se sente a vida?
A saudade
A despedida
O amor
A dor
Tristeza e Alegria
Dúvida e certeza
Medo
Coragem
Peso
Leveza
Como se sente que se vive de verdade?
Que quando a morte pedir a mão
Sem pestanejar vai-se numa paz
Pois nada ficou para trás
Como?

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

ACABOU

Acabou na boca
Acabou na geladeira
Na água que despenca do chuveiro
No ângulo da ladeira
Na fantasia exasperada de fevereiro
Acabou o ano inteiro


Acabou no quarto
Acabou na gaveta
No cheiro secreto da roupa dobrada
No asfalto da Anchieta
Na cama que agora acorda arrumada
Acabou sem dizer nada

No copo que madruga sobre a pia
Nos viadutos da cidade
Na ignorância de quem nem sabia
No trânsito desta tarde

Acabou nas mãos
Acabou nos anéis
No café amargo da manhã com pressa
No bilhete no bolso da sessão das dez
No circular que demora mas ainda passa
Acabou sem fazer graça

No escuro do armário
No vazio confessionário
No entulho das gavetas
No barulho das cornetas
Num andante pinéu
Num olhar estanque no céu
E tudo mais que existe por aí
O que eu ainda nem vi
E se no mundo afora já foi o fim
Por que não acaba também dentro de mim?